Onde estão seus heróis?

(Publicado no Jornal de Piracicaba, dia 01 de outubro de 2016)

“A sociedade está parindo legiões de psicopatas, muitos disfarçados de chiques ou light”. (Arnaldo Jabor).

O conceito de “herói” é abrangente no dicionário e parece que o inconsciente coletivo caminha imprudentemente no uso equivocado dessa abrangência.

A mídia faz seu papel, “distribuindo” à população os chamados “heróis” do dia a dia. E essa articulada “ilusão” pode vir travestida no participante de um reality show, em alguém com um corpo escultural e rosto atraente, em políticos com forte poder de persuasão, em jogadores de futebol que recebem milhões em dinheiro para exibir a marca do patrocinador e influenciar com seus valores, em cantores, em adolescentes que “ditam” as regras nos “youtubes” da vida, em filmes que fazem as pessoas acreditarem que “aquela” é a solução para suas vidas. Quem disse que o que acontece em filmes ou livros é o retrato da vida real? Quem disse que o que aconteceu naquele filme, com aquela “atriz”, ou com “aquele casal”, ou então com as palavras persuasivas de alguém é o que você realmente “precisa”?

Enquanto muitos se escondem de si mesmos usando uma ideologia (e apenas um dos exemplos disso vemos claramente em componentes de partidos políticos), paradoxal e paralelamente fazem suas vidas se tornarem cada vez mais desinteressantes e mortas. As estatísticas (já com as consequências) estão abertas para todos...

“Adoro qualidade e bom gosto”. Ouço muita gente falar assim. Mas pergunto: “qual a mensuração que se tem de qualidade e bom gosto?” A sociedade contemporânea carece da liberdade verdadeira e então produz a falsa. O desejo “reprimido” de ser livre e superar os limites repressivos da sociedade e de si próprio (por falta de conteúdo e autoconhecimento) encontra neste utópico mundo de “super-heróis”, a “complementação ilusória do vazio”. Neste círculo vicioso e perigoso de rompimento com a realidade e consigo próprio, as pessoas avançam limites. Nasce aí o potencial “libertador” que dá aval e explicação para a busca desenfreada pelos “heróis”, ao se manifestar o desejo reprimido de liberdade. E aí: haja apelação, haja sexo, haja desonestidade, haja atropelamento moral, haja injustiça, haja doenças emocionais. Haja “liberdade”...

A imensa inversão de valores, a busca da futilidade e a superficialidade que mergulha o ser humano já é fato. Precisamos lutar para a conscientização da importância do conhecimento da causa e a busca da cura de todo esse processo que escraviza o ser humano, muitas vezes sem que ele nem perceba.

E para isso permita-se apimentar um pouco mais a discussão. Será que os diversos tipos de heróis escolhidos pela humanidade hoje se preocupam com seus admiradores? É triste ver que muitos dão mais valor a esses falsos heróis do que aos próprios filhos, pais, emprego, família, casamento, relacionamento, estudo, jogando tudo a “segundo plano”. Faz sentido? Isso é amor próprio? Concorda que tem algo errado aí?

Caso você realmente prefira os verdadeiros valores, os que alimentam a alma e fazem sentido a curto, médio e longo prazo, você também vai perceber que esses “heróis” que são buscados e valorizados hoje em dia estão bem distantes desse cenário! É só parar para refletir um pouco...

Os verdadeiros heróis são os pais que praticamente dão a vida pelo sucesso de seus filhos. Os verdadeiros heróis levantam cedo para o trabalho digno e honesto, infelizmente quase sempre recebendo muito menos do que merecem. Nossos heróis, na realidade, se vestem de farda para garantirem segurança e ordem pública. Outros de nossos heróis vestem toga e lutam pela justiça, ainda que em troca disso corram o risco de colocarem suas cabeças a prêmio. Nossos heróis estão, isso sim, nas salas de aulas para transmitir o conhecimento intelectual e moral, mesmo que para tanto tenham que se sujeitar a grosseria e a indisciplina de seus alunos, e, ao fim do mês, sentirem vontade de chorar ao verem seus holerites. Outros heróis se vestem de branco e trabalham em postos de saúde precários, sem o mínimo de condições de trabalho, pois as autoridades não se preocupam muito com esse assunto. Nossos heróis de verdade estão na direção de Igrejas e Instituições realmente comprometidas com o bem-estar social, com a paz, a verdade, a ajuda física e espiritual aos mais necessitados, com a coerência entre pregar e praticar o que se prega, além de tantos heróis anônimos, dos quais sequer nos lembramos no nosso dia a dia...

Esses sim são os heróis, descompromissados de vaidade e de orgulho, sem nenhum interesse em aparecer na mídia ou enriquecer financeiramente.


A rotina do mundo, infelizmente, é eleger como heróis as pessoas erradas. Vítima ou não, resolva-se. Conheça-se. Acorde. Coloque e siga - na sua vida e na vida da sua comunidade - os verdadeiros heróis.

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