"Máscaras"


Patrícia acorda e percebe que não queria se casar. Seu sonho era ser médica e sair pelo mundo em campanhas humanitárias, auxiliando as pessoas. Entretanto, olhando para o marido deitado, percebe que “realizou o sonho da sua mãe”, de ser uma mulher modelo, cuidando da casa, dos filhos, do marido.

Carlos um belo dia descobre que não queria ser Advogado. Na verdade, passou anos na Faculdade de Direito, mais outros tantos se preparando para um concurso e agora é Promotor. Um promotor que apenas promoveu a vontade do seu pai, pois isso é o que ele queria para o filho. Um dia, Carlos tem um “insight” vendo uma partida de futebol profissional e sente o quanto seria verdadeiramente feliz estando lá entre as quatro linhas, com os outros jogadores. Nada mais nada menos que um sonho destruído e, a essa altura, sem chance de volta...

São poucos os que conseguem ter a coragem de olhar para dentro de si e perguntar com total transparência: “Quem sou eu e o que quero para mim?” ou “Estou indo para onde meu verdadeiro eu gostaria de ir?” ou “Estou sendo quem eu realmente gostaria de ser?”

“O principal objetivo da Terapia não é transportar o paciente para um impossível estado de felicidade, mas sim ajudá-lo a adquirir firmeza e paciência diante do sofrimento. A vida acontece no equilíbrio entre a alegria e a dor. Quem não se arrisca para além da realidade jamais encontrará a verdade”. (Carl Jung)

Essa frase de Jung tem um valor incomensurável se pensarmos em sabedoria de vida. Veja, caro leitor, que ele traz paradoxos colocados completamente fora de uma “ordem natural”... Começa nos convidando a refletir sobre o que é felicidade, o que é sofrimento, o equilíbrio entre a alegria e a dor e, no “final”, oferece a causa, dando o antídoto.

Qual é a sua realidade hoje? Você se arrisca para além dela? Ela é a realidade que você realmente desejaria estar se estivesse em sintonia perfeita com você mesmo? Mas... você está nessa sintonia? Ou está na sintonia do “deixa a vida me levar?”

Para ajudar no entendimento da inteligência que Jung nos presenteia, vamos a uma de suas frases que mais aprecio: “Sua percepção somente se tornará clara quando você realmente puder olhar para dentro de você mesmo.”

Fazendo parte deste caminho, não tenha dúvida que está sua história, com grande participação da família, pois é lá que tudo começa e é preciso que as pessoas olhem isso com mais atenção. Na história de cada um de nós é que tudo foi construído e vem sendo! A base de tudo. Das máscaras também...

Pai e mãe são os primeiros heróis, seja em que sentido for, uma vez que são muitas as formas de criação e de crenças que limitam.

Nosso passado plantou em nós regras, ideologias, formas de encarar isso ou aquilo, procedimentos, enfim, nos transformou no que somos hoje ou seremos amanhã, pois o cenário vai se ampliando na medida em que vamos trocando figuras antigas por novas, como o marido, a esposa, os filhos, os relacionamentos afetivos, de trabalho, heróis ou vilões da mídia, etc.

Nesse quadro - aliado ao agravante da vida frenética que vivemos - a neurose aos poucos vai tomando conta. A dupla: “exigência + expectativa” nos esgota, porque precisamos cada vez mais de autocontrole para não nos decepcionarmos ou decepcionarmos os outros, até aqueles que quisemos por tanto tempo impressionar e atender ao longo de nossa vida. Está aí a raiz da maioria absoluta dos problemas e doenças emocionais de nosso século, fruto de um padrão de vida que nos separa de nós mesmos cada vez mais, tirando de nós nossa própria referência.

Lembra-se do que Jung disse sobre terapia?

Faça uma retrospectiva de sua vida e perceba se as opções que você fez foram baseadas em expectativas alheias ou na sua própria. Em seguida, tenha a coragem de reiniciar sua rota, seguindo suas próprias convicções, ouvindo sua própria voz interior e fazendo as modificações e ressignificações necessárias para viver uma vida mais realizadora, coerente, alegre, verdadeira, plena, livre de travas, inseguranças e máscaras, que tanto estão atrasando e prejudicando as pessoas e o mundo que vivemos.

Você já encontrou a verdade?

(Texto também publicado no Jornal de Piracicaba do dia 28 de janeiro de 2017, em artigo semanal do autor).





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