Além da visão

“Erros são, no final das contas, fundamentos da verdade. Se um homem não sabe o que uma coisa é, já é um avanço do conhecimento saber o que ela não é”. (Carl Jung)

Um soldado, após ter lutado numa guerra, estava voltando para casa. Ligou, então, para seus pais: “Estou finalmente voltando para casa, mas preciso pedir um favor: gostaria de levar um amigo comigo”. Os pais aceitam de imediato, porém, o filho informa que este amigo sofreu um grave acidente na guerra, perdeu um braço e uma perna e gostaria de levá-lo para morar em sua casa. Os pais respondem: “Eu sinto muito meu filho, talvez nós possamos ajudá-lo a encontrar um lugar para ele morar”. E o filho: “Eu quero que ele more conosco”. Neste momento os pais não aceitam e tentam convencer o filho a mudar de ideia, pois essa situação mudaria a rotina deles e, portanto, pedem para ele abandonar a iniciativa.

O filho desliga o telefone e eles perdem o contato com ele. Dias depois recebem uma ligação da polícia informando que o filho deles havia morrido após ter caído de um prédio e acreditavam ter sido suicídio. Aos pais, restou ir ao necrotério para reconhecer o corpo. Eles reconheceram, mas descobriram que o filho tinha apenas um braço e uma perna.

O ser humano, por natureza, tem o medo do não e a ansiedade do sim. Vamos abordar hoje um assunto que conhecemos bem, mas fazemos questão de não dar o devido valor. Temos uma tremenda facilidade de amar e preferir o que conhecemos, entretanto, temos medo do que não conhecemos.

Na verdade, esses pais são como muitos de nós. Achamos mais fácil amar aqueles que são divertidos, inteligentes, bonitos, carismático, perfeitos... Quantos gestores perdem excelentes oportunidades de melhorar o desempenho de seus departamentos por confundirem o lado pessoal com o profissional, não sabendo descobrir ou maximizar o talento de alguns de seus funcionários ou mesmo tentar entendê-los. Resultado? Péssimo ambiente e clima de trabalho, equipes insatisfeitas, potenciais talentos enterrados ou subutilizados, demissão, falências.

Os verdadeiros líderes sabem navegar bem nisso. Ser líder é bem diferente de ser chefe, mesmo porque líderes dão exemplos, encantam, fazem, incentivam, colaboram, elogiam. Chefes mandam. Não conseguem se libertar de seu egoísmo ou de seus “mundos particulares” em prol de uma visão mais ampla e abrangente. Quantos chegam ao absurdo de serem preconceituosos com funcionários ou se esquecem de trabalhar os valores que muitos têm e que podem ser decisivos para a empresa e para os resultados. Focam no erro, no negativo. Aplica-se o mesmo em outros cenários (pais, amigos, clientes, fornecedores, igrejas, associações, política, etc.). Não gostamos das pessoas que nos incomodam ou nos fazem sentir desconfortáveis. Ficamos longe daquelas que não são (para nosso mundo e nossa “visão”) saudáveis, produtivas, bonitas ou interessantes. 

Ficamos longe e não gostamos das que são sinceras conosco. Preferimos as que nos elogiam e, então, paradoxalmente, nos ajudam a esquecer ou a descobrir quem realmente somos. Se não gostamos de alguém, temos uma grande oportunidade de analisarmos o que ela tem que está em falta em nós e, então, começarmos um trabalho de evolução. 

Quantas vezes preferimos ficar com as primeiras impressões, sem ao menos tentar conhecer melhor aquela pessoa, o que ela passa, o que ela quis dizer com o que falou, o que há por trás de determinada atitude.
Precisamos gerenciar melhor as diferenças. Compreenda a vida num todo e não apenas no que o mundo acredita que é “belo” ou “melhor”. Aprenda com seus erros e supere-os. 

Expanda seus horizontes mentais. Na vida acontecem inúmeros milagres diariamente. Procure-os, não deixe nada te desviar desse foco e você vai encontrá-los. Quando abrimos nossa mente para o novo, ele acontece e nos surpreende.


Ir além da própria visão é talento de quem quer ser diferente, num mundo cada vez mais igual.



(artigo também publicado no Jornal de Piracicaba, edição do dia 26 de agosto de 2017, em coluna semanal do autor)

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