E se você ficasse sem?

“O homem tem a capacidade de superar mais rapidamente a perda do pai do que a perda de bens materiais, de parte ou completo patrimônio”. (Nicolau Maquiavel).

O que realmente tem valor para você? Crescimento pessoal, amigos, colegas, bens materiais, família, saúde... O que está por trás da famosa e verdadeira frase que diz que só damos valor quando perdemos? E quando se perde alguém ou algo e a tristeza não vai mais embora ou demora muito para ir?

Na Universidade de Economia de Luxemburgo, uma pesquisa conduzida pelo Professor Conchita D’Ambrosio fez descobertas fascinantes sobre este tema. “É de se esperar que os pobres estejam menos satisfeitos com a vida do que as pessoas cheias de bens materiais, mas queríamos testar se a felicidade poderia ser recuperada com o tempo”, argumenta Conchita. Neste estudo, ele coletou e avaliou informações obtidas em entrevistas com mais de 40 mil pessoas. A conclusão foi que nessa amostragem elas não conseguiram se adaptar emocionalmente a uma nova realidade “negativa”, como por exemplo a pobreza e outras perdas.

Maurice Maeterlinck disse que tudo o que amamos, mais dia ou menos dias, iremos perder, porque “a vida é a perda lenta de tudo o que amamos”.

E então: o que realmente importa? E se você ficasse absolutamente pobre da noite para o dia, se tornaria uma pessoa infeliz também? E se perdesse, por morte ou não, a pessoa que está ao seu lado, como seguiria sua vida? E se algo se complicasse seriamente com relação à sua saúde, você estaria preparado? E os “amigos”... Será que aqueles que “estão hoje ao seu lado em momentos bacanas” serão os mesmos que estarão nos momentos não tão bacanas assim?

Perdas, como você lida com isso? Reflita sobre sua situação emocional... Ela se desestabiliza com frequência, dependendo das nuances da vida? Sendo mais específico: você só está bem quando tudo está “do jeito que você quer ou gosta”? Você sente “empatia” por alguém só quando esse alguém fala coisas que você gosta de ouvir? E quando esse “alguém” fala verdades sobre você que você não aceita ou não concorda, para onde vai a “empatia”?

Venho de uma família batalhadora, simples. Minha mãe, mesmo com sérios problemas físicos desde sua infância, me mostrou (com exemplos, prática) o valor do trabalho, da dignidade, da honestidade e da disciplina. E, por consequência natural, me ensinou a dar valor às pessoas e ao que temos, independentemente da valoração que elas possam ter. Enfim, me mostrou a grande fragilidade do ter, se comparado a fortaleza do ser.

Caro leitor, quando a raiz é forte, todo o resto se sustenta. Não há problema algum em ter dinheiro, conquistar bens e progresso financeiro, desde que - entre você e tudo isso - fique claro quem é dono de quem. Não há problema em se apaixonar, amar, desde que você se ame, prioritariamente, até porque precisa se amar muito para poder sentir isso por outra pessoa, caso contrário você estará sentindo qualquer coisa, menos amor verdadeiro. Aí é uma questão de uso do livre arbítrio.

Apego traz dependência e dependência traz escravidão (física, emocional ou material).

Quem se domina, domina também os “apetites” materiais e as ilusões emocionais, distribuídos com grande quantidade e criatividade no mundo de hoje, sempre num círculo vicioso perversivo e acumulativo, mesmo que você não perceba.

Só não se apega quem se conhece e se encontra consigo mesmo, quem se concilia com a realidade e tem a perfeita noção de seu próprio valor ou da necessidade do desenvolvimento, com atitudes. O mundo não gira ao nosso redor e ninguém foi criado para atender nossas carências. Pensar assim é ser escravo da própria existência. Somos nós que temos que nos resolver, antes de qualquer outra coisa. Tudo o que existe ao nosso redor deve “participar” de nossa vida e não “comandar” nossa vida, caso contrário, mesmo antes da perda, você já estará sem. Imagine depois...

Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência. (Fernando Pessoa).

Mas, então, e se você ficasse sem?




(artigo também publicado no Jornal de Piracicaba, dia 24 de junho de 2017, em coluna semanal do autor)


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